Sobre a chuva de 26 de março de 2025

Por Deivison Santos, pesquisador de irrigação e drenagem da Embrapa Milho e Sorgo |||||

Como todos perceberam, recebemos uma chuva intensa no meio da tarde de 26 de março, aqui na Embrapa Milho e Sorgo, em  Sete Lagoas, MG. Sendo mais preciso, entre as 15h e  pouco depois das 16h, choveu    90,4 mm, registrados pela estação agrometeorológica do INMET instalada em nossa Unidade. Esse volume representou a maior quantidade diária de chuva verificada na atual safra, que já acumula 1.014 mm desde 1º de julho de 2024. Após um veranico prolongado, as águas de março deram as caras! Mas podemos dizer que se tratou de um evento anormal, ou extremo?

A análise de fenômenos chuvosos, em um contexto de conservação de solo e água, pode ser baseada em três grandezas: intensidade, duração e frequência (IDF).

Quando falamos sobre intensidade e duração, a chuva pode ser classificada como (1) fraca de curta duração, (2) fraca de longa duração, (3) forte de curta duração e (4) forte de longa duração (Tabela 1).

Essa classificação indica a erosividade, ou o potencial da chuva causar erosão. Portanto, também implica no nível de risco de dano da chuva.

No primeiro caso, chuva fraca de curta duração, a única preocupação é se choveu o suficiente.

Ao passo que no caso de chuva fraca de longa duração, há a preocupação se o solo tem capacidade de infiltrar o volume de água ao final do dia. Nesse caso, o parâmetro que deve ser medido é a chuva diária máxima (Cmáx), em mm/dia. Uma das formas de calcular o Cmáx é pela análise de distribuição de Gumbel, que consiste em um modelo estatístico para analisar dados de uma série histórica.

Em síntese, a Cmáx nos diz que uma determinada estrutura hidráulica foi projetada para suportar uma chuva de tantos mm/dia, que tem a ocorrência no período de retorno pré-determinado. Para obras hidráulicas de menor vulto, como terraços, drenos e pequenas barragens, indica-se um período de retorno de 10 anos.

Dando sequência à classificação dos eventos de chuva, o terceiro tipo é de chuvas fortes de curta duração. Como o potencial de dano é maior, a preocupação é se solo, estruturas hidráulicas e edificações estão devidamente protegidos, bem como de que forma o fluxo hídrico poderá ser disciplinado, devendo ser direcionado a uma área capaz de promover a perda de energia cinética e favorecer a infiltração ou reservação. Nesse caso, o parâmetro a ser determinado é a vazão de enxurrada (Imáx), em mm/h.

O último e mais preocupante tipo, chuvas fortes e de longa duração, é de natureza catastrófica, como o ocorrido no Rio Grande do Sul, no ano passado. São as chuvas mais raras, pois contrariam o princípio de que a intensidade da chuva é inversamente proporcional à sua duração. Nesse caso, existem os métodos para confecção da curva de nível de prejuízo, curva de prejuízo histórico e equação de dano agregado.

Respondendo à pergunta inicial, a chuva de 26 de março à tarde pode ser classificada como chuva forte de curta duração, com o registro de mais de 90 mm/d.

Ao realizar a análise de distribuição de Gumbel com a série histórica de chuva da Embrapa Milho e Sorgo, obtida na plataforma online (e gratuita) NASA Power, chegou-se ao valor de Cmáx de 45 mm/dia, para um período de retorno de 10 anos (Figura 1).

Figura 1. Análise de distribuição de Gumbel para determinação da chuva diária máxima da Embrapa Milho e Sorgo. Créditos: Deivison Santos

Porém, para chegarmos no valor da chuva total diária de 26 de março, 90 mm/d, é preciso alterar o tempo de retorno para 300 anos!

A Imáx é calculada por meio da equação IDF tipo Sherman, que utiliza parâmetros localizados (coordenadas) e gera os dados utilizados para confecção da Curva IDF (Figura 2), que relaciona a intensidade com um tempo de duração para uma dada frequência, ou tempo de retorno (TR). A Curva IDF é muito utilizada para o dimensionamento de obras hidráulicas.

Figura 2. Curva IDF da Embrapa Milho e Sorgo. Sete Lagoas, MG.
Créditos: Deivison Santos

De acordo com os dados registrados, no dia 26 de março choveu 83 mm entre as 15h e 16h. Analisando a Curva IDF, constata-se que a intensidade de chuva correspondente é encontrada em um tempo de retorno (TR) de 30 anos (curva amarela). Se considerarmos que choveu 90 mm em 90 minutos, o TR é de cerca de 150 anos.

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